Sarajevo, a Jerusalém Européia  

Posted by carlos in

Era assim que seus moradores orgulhosamente se referiam a Sarajevo antes da guerra: a Jerusalém da Europa. Essa era a síntese de um povo pluralista, convivendo em harmonia antes que alguns doentes brutais, possuídores do poderio militar, conseguissem exacerbar o nervo nacionalista de uma minoria. Lar de cristãos católicos e ortodoxos, de uma maioria árabe e até de judeus (dos poucos que sobraram da segunda guerra mundial), ambos falando o mesmo idioma Eslavo servo-croata apesar das naturais diferenças de dialeto entre as etnias. A mistura era enorme antes da guerra: vizinhos de diferentes origens étnicas e as pessoas crescendo normalmente em círculos mixtos de amigos. Igrejas, catedrais e sinagogas partilhando o mesmo bairro com um maior número de mesquitas. Depois da guerra, uma maior separação geográfica ocorreu, mas que felizmente não minou a multiculturalidade da Jerusalém Européia.

Faz muito bem à alma caminhar por Sarajevo e por seu caleidoscópio de culturas, testemunha perene da história antiga e recente, de um holocausto judeu e outro islâmico. Oriente e ocidente lado a lado, na mesma rua. Ir nos cafés aonde os anciões se juntam de manhazinha; ir de noite nos bares e boates aonde a juventude vai curtir tanto música ocidental como árabe, seja portando suas vestimentas mais tradicionais ou algo mais modernoso; ver as marcas ainda claras do cerco, seja em prédios ainda não reconstruídos ou em muros de casas forrados de marcas de bala; caminhar pelas colinas que abrigaram os assassinos de outrora, e contemplar a cidade em seu vale lá embaixo ouvindo os cânticos ecoando dos autofalantes das mesquitas (isso nunca vai me sair da retina nem dos ouvidos); ver na mesma rua placas ou letreiros escritos em alfabeto Romano, Árabe e/ou Cirílico; ter esse meu primeiro contato com mesquitas, madrassas, e outras típicas instituições do mundo islâmico que viriam a se tornar comuns mais adiante em minha viagem; conhecer o cemitério judeu, o segundo maior da Europa (o primeiro fica em Praga), fechado a novos moradores desde 1966; arrebentar a alma em ver os inúmeros cemitérios islâmicos que se espalharam pela cidade depois da guerra, onde todas as lápides apresentam uma data de enterro em comum; conhecer a ponte Latina, onde Gavrilo Princip assassinou o herdeiro Habsburgo e criou a história do século XX.

Para aumentar ainda mais o fascínio, como se fosse preciso, quando eu subia uma colina para chegar a um daqueles cemitérios, que possui uma linda visão da cidade e do rio que a corta, encontrei duas garotinhas brincando num parque. Super tímidas, alegres, e curiosas, tentava me ´comunicar` com elas para que elas perdessem o receio e me deixassem roubar uma foto; só no retorno, consegui, para minha própria recordação do sorriso desse povo.

É com esse sorriso, e com a alegria de sua juventude nas ruas e bares, que Sarajevo continua a fascinar: há 15 anos atrás, completamente destroçada por parte de uma etnia que a habita; hoje, uma nova geração nas ruas (parida enquanto parte de seus pais defendiam sua cidade), estudando e trabalhando, seguindo a construir essa nação que tantas lições de humanismo tem a oferecer a quem quiser explorá-la. Eu fui embora com a promessa de voltar. E é de se ficar contente com o fato de Sarajevo ter passado a ser alvo de campanhas de organizações turísticas, com a cidade sendo eleita um dos destinos obrigatórios da Europa em 2010. Com isso, a aura de cidade perigosa dos anos 90 deve se acabar, e mais pessoas virão aprender um pouco das lições de tolerância que seus sobreviventes teimam em nos ensinar.

Será que eu deixei transparecer o quanto sou fã desse lugar? Ah é, faltaram as fotos.
O primeiro album é um apanhado de fotos pelas ruas; mesquitas (Imperador, Ferhadija, Gazi Husrev-Bey), ponte Latina, arquitetura pela cidade com seus principais prédios como Academia de Arte, Museus, Biblioteca, e Prefeitura, as ruelas de Bascarsija (centro antigo) com suas feiras e bazares, a velha sinagoga judia, as igrejas ortodoxa santa mãe de deus e católica sagrado coração de jesus.



Neste segundo album, o foco inicial é o Túnel da Esperança e seu museu-memorial, passando depois às visões panorâmicas da cidade e seu vale, tiradas de diversas posições a partir das colinas que a cercam, do cemitério judeu e de vários cemitérios islâmicos pós-guerra tendo, em contrapartida, o sorriso cativante das crianças Bósnias.



Bom, o difícil veio. Era tempo de ir embora e seguir viagem. Destino: o lado invasor, Sérvia.

This entry was posted on segunda-feira, julho 19, 2010 at 6:55 PM and is filed under . You can follow any responses to this entry through the comments feed .

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