Um dia ia acabar. Mas a estrada vicia.  

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Eis o mapa final da aventura. Lisboa a Cairo por 42 países em 7 meses de MUITA história, beleza, aprendizado e algumas infelicidades. E alguns novos amigos feitos pelos caminhos cruzados. Praticamente toda a Europa percorrida de trem (barco e ônibus algumas vezes), além de ter 'beliscado' Ásia e África.


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Pois é, teria que acabar um dia. Não vou me por aqui a querer resumir ou ficar elegendo melhores e piores; tudo teve seu devido valor e importância. É muita coisa; paisagens tão diversas, culturas tão distintas. Aprendi muito. Além do turismo em si, eu queria nesse meu giro me colocar em contato com costumes e lugares que não estamos acostumados do lado de cá do Atlântico.

Acho que a própria maneira de eu escrever os posts é um reflexo disso. Na primeira metade, mais pela Europa Ocidental, Reino Unido e Escandinávia, os posts eram mais curtos, iam direto para as fotos e alguns detalhes de minha passagem pelo lugar; claro que há locais e culturas tão fascinantes quanto em qualquer parte do mundo, mas é algo que estamos um pouco mais acostumados.

Já na segunda metade, mais pela Europa Oriental, Turquia e principalmente os Balcans, os posts ficaram mais extensos, carregados de História e de algumas opiniões sobre temas mais espinhosos. Nessa parte do mundo o 'estranhamento' é enorme e por isso mais atraente; religião, costumes, alfabeto, idioma e uma mistura inacreditável desses elementos; costumes Islâmico, Cristão, Ortodoxo; alfabetos Latino, Cirílico, Árabe; gente geograficamente tão próxima e culturamente tão distinta. Clichês à parte, é um caldeirão de culturas, o choque Oriente-Ocidente graças ao avanço do Império Otomano pela Europa entre a conquista de Constantinopla (e o fim do Império Bizantino) e o fim da primeira guerra mundial (quando o Império Austro-Húngaro também ruiu).

Aí houve uma mudança de trajetos por eu frustadamente não ter ido à Rússia, embora tenha tentado o visto duas azaradas vezes. Em vez de terminar meu giro conhecendo o Norte da África de Egito a Marrocos, fui me perder pelo ultra-complicado Oriente Médio; viajar por terra entre Turquia e Egito é mais difícil e custoso do que pela Europa. Mas em termos de 'estranhamento' não poderia ser mais rico; a grande e irônica infelicidade é que fui assaltado em Jerusalém e perdi a câmera com 1 mês de fotos sem backup, que cobriam da Polônia a Israel-Palestina (menos Petra e Baalbek). Nesses posts eu incluí links com fotos de terceiros para não ficar só nas palavras.

Além da Rússia também não consegui conhecer seus vizinhos Ucrânia, Moldávia e Bielo-Rússia pelos mesmos problemas de visto demorado; eu tentava os vistos pela estrada. Por toda Europa Brasileiros precisam de visto de turismo apenas na Sérvia, mas este foi rápido. Acabei excedendo em uma semana o tempo permitido no Espaço Schengen, que usei bem descontinuamente, e não tive problemas ao sair; mas sei que foi sorte. E aos interessados, em cada cidade que passei eu pus um link no respectivo post para o albergue que fiquei.

Mas o que eu prefiro mesmo é o mapa abaixo, mais ainda depois dessa viagem. O planeta como deveria ser, sem as fronteiras e linhas que o macaco-homem inventou e que foram tanto alteradas por séculos de guerra, cortando e deslocando etnias que tantas vezes pertencem à nação do outro lado da fronteira. Na cabeça simples de quem não entende o porque de ser 'diferente' implica em não poder compartilhar o mesmo lugar e o mesmo dia a dia, essa viagem deixa a pessoa ainda mais esquizofrênica: tanta beleza em indescritível diversidade, e tanta dificuldade em misturar-se e aprender mutuamente com os vizinhos.


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Concluo dizendo que a estrada vicia! Fica aquela vontade de conhecer a Ásia e a África, mas acho que isso não vai acontecer. Na América do Norte eu vivi por uns 6 anos. Tinha quase certeza que a próxima viagem seria por nuestra América Latina, de México à Terra do Fogo; mas a grana e o tempo que me sobraram, e principalmente as distâncias enormes envolvidas, me fizeram decidir por plano menos ambicioso mas não menos esperado.

Saio agora a me perder pelo Continente Brasileiro, uns cinco meses entre Agosto/2010 a Janeiro/2011, passando por todos os 26 estados de nosso país, iniciando em Brasília. Claro que o estranhamento será infinitamente menor, nao há o que comparar até porque temos oficialmente apenas 500 anos de existência. Mas a idéia agora é mergulhar em nossa própria gente e natureza, norte a sul, leste a oeste, costumes e paisagens tão diversos mas unidos em uma mesma cultura. Deve rolar um blog dessa viagem também; se rolar eu ponho o link por este blog.

Portanto... nos vemos pela estrada! Vou cobrar daqueles que já ofereceram um teto e uma cama pelo país, e continuo aceitando 'ofertas' de hospedagem. :) Também aceito palpites de locais que não poderia perder em dado Estado.

Cairo, parada final dessa incrível viagem  

Posted by carlos in

Cairo, última parada de minha viagem, 42 países e 7 meses depois, podendo crer que pus os pés na África. O trem de Luxor me trouxe até a cidade; no primeiro dia fui reto a Giza, post anterior. Na volta, me restavam só uns dois ou três dias antes do vôo de retorno. Capital e maior cidade do Egito, da África e de todo mundo Árabe, Cairo tem quase 7 milhões de habitantes, atingindo 18 milhões em sua área metropolitana que, entre outras, inclui a própria Giza. Gigantesca megalópole com os típicos problemas de poluição e razoável caos pelas áreas mais centrais (aos olhos de um forasteiro), seriam necessários muitos dias para se conhecê-la devidamente; porém, com tudo de errado que aconteceu pelo Oriente Médio acabei perdendo mais tempo (e dinheiro) antes dessa parada final. Inevitavelmente gastaria um dia inteiro no Museu de Cairo e o restante pela cidade.

Felizmente há metrôs para você conhecer distritos mais distintos embora as linhas sejam reduzidas. Por exemplo, não vão à Velha Cairo, onde aliás os sítios históricos são bem espalhados e acabou nem dando tempo de conhecê-la toda. Além do Museu e da Velha Cairo, perambular pelas margens do Nilo e pegar uma balsa é obrigatório, sendo bem fácil fazê-lo em downtown entre as pontes que conduzem à ilha Gezira, fincada no meio do Nilo à caminho de Zamalek, um distrito mais rico da cidade; aliás fiquei neste hotel barato em downtown. Em Zamalek a Torre de Cairo, quarta maior do mundo com 187 metros, fornece a panorâmica perfeita da Cairo atual; é preciso conhecer aquela área de dia e de noite, aquele fluxo de pessoas e barcos iluminados e animados a cruzar o Nilo (lembrou muito Istambul-Constantinopla entre Europa e Ásia). Some-se a isso deixar-se perder pelo 'caos' de downtown, bares, cafés e fast-food Árabe dentre os locais, e dar uma passada pelo distrito de Heliópolis, sede da presidência, e tem-se ao menos um gosto do que é essa cidade.

A atual Cairo se expandiu da Velha Cairo, que por sua vez ficava nas proximidades de Memphis, capital do antigo Egito Inferior e do Velho Reino. A Velha Cairo surgiu por volta do século IV quando o primeiro povoado Romano se instalou no que hoje são as ruínas do Forte Babilônia, na área chamada de Cairo Cóptica, que era o centro Cristão da cidade. Àquela época Memphis já estava bem enfraquecida pois Alexandria era o centro do país (veja os posts introdutórios do Egito); após a conquista Árabe pelo Califado Rashidun e o estabelecimento de Fostat, o centro Islâmico da Velha Cairo ao norte do Cristão, como capital do país em 641, Memphis entrou gradualmente em esquecimento enquanto Fostat tomava o lugar de Alexandria.

Mas foi em 969, quando o Califado Fatimida conquistou o Egito que uma nova capital fortificada foi construída, logo ao norte de Fostat, e foi chamada Cairo; Fostat acabou em ruínas com um incêndio em 1168. Com o crescimento de Cairo, a cidade anexou as ruínas de Fostat e da Cairo Cóptica. Veio a conquista de Saladin em 1169, derrotando os Cruzados, instalando a dinastia Ayyubid no país, e construindo a Citadela de Cairo que foi a sede do poder Egípcio até o século XIX. A importância da cidade diminuiu aos poucos entre o domínio dos Mamelucos (1250-1517), período em que a Pesta Negra ceifou cerca de 200 mil vidas e uma nova rota marítima foi inaugurada pelo Cabo da Boa Esperança após Vasco da Gama, e o domínio dos Otomanos (1517-1802), cuja capital absoluta era Constantinopla. Ainda assim, pelo século XIX Cairo, a segunda maior cidade Otomana, continuou relativo crescimento.

Veio então em 1802 a dinastia de Ali Pasha, que modernizou a cidade trazendo maiores investimentos e influências Européias, também acarretando um grande endividamento ao país principalmente pela construção do Canal de Suez. O Reino Unido invadiu o Egito em 1882 lá ficando até sua independência em 1922, embora as tropas Britânicas só tenham sido expulsas após a Revolução Egípcia de 1952. Cairo não parou de se modernizar e se expandir em novos distritos; boa parte de downtown reflete esse período de maior influência Européia na arquitetura, embora suas ruas hoje sejam dominadas pelo cotidiano Árabe.



Cairo necessitaria de muitos albums, mas o tempo curto acabou me deixando apenas com esse acima onde consta: o Museu do Cairo (fotos não são permitidas no interior), onde dei sorte pois a exposição das relíquias da tumba de Tutancamon, descoberta quase intacta no Vale dos Reis em 1922, havia acabado de retornar ao país (elas são magníficas, e o Museu todo é soberbo); a Velha Cairo, com a Cairo Cóptica (o centro Cristão antes da conquista Árabe) e o Museu Cóptico, a Igreja Pendurada, e outras igrejas como a Grega São Jorge, com as ruínas da Fortaleza Babilônia ao redor; o antigo centro Islâmico de Fostat, ainda na Velha Cairo, com a mesquita Amr ibn al-As, a primeira do continente Africano (642), e outras mesquitas como a al-Azhar (972) que deu origem à universidade homônima, insituição central da teologia Sunita.

Em Cairo há também a sinagoga de Ben Ezra (1115), feita supostamente no local em que o bebê Moisés foi encontrado, para quem acredita nessas coisas, e a mesquita de Ali Pasha (1848) onde a tumba do mesmo se encontra. Infelizmente não deu tempo de ir à Citadela de Cairo, provavelmente o local mais interessante de toda Velha Cairo. O album termina com o mítico rio Nilo, downtown de um lado, ilha Gezira e distrito Zamalek de outro, e a estupenda panorâmica da Torre do Cairo, que deve ser bem melhor em dias mais limpos.

Chegava ao fim a aventura. Hora de ir ao aeroporto, pegar o vôo até São Paulo, após uma longa escala em Lisboa. Aquela mistura de tristeza pelo fim de uma viagem que às vezes nem acredito que fiz, e também alegria pois estava mesmo cansado depois de tanta poeira na estrada! No próximo e último post, o mapa do percurso.

Giza, os eternos monumentos do Velho Reino do Egito  

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Voltaria a pegar um trêm depois de apenas usar ônibus e vans por todo o Oriente Médio. Cortando norte a sul do país, de Alexandria a Aswam, há trens e horários especiais para turistas que obviamente não quis pegar. Quando fui tomar um dos trens 'normais', um guarda não queria permitir dizendo que eu era obrigado a pegar os outros. Necessário comentar: insisti com o guarda até que ele sutilmente sugeriu que se eu pagasse um pouco mais ele me liberaria (ao menos aqui foi mais sutil e até ganhei um lugar decente na janela; na fronteira Síria foi pior, como escrevi por lá).

Assim cheguei em Cairo, e felizmente a nuvem negra que ganhei em Jerusalém ficou em Luxor pois eu estava bem melhor. Mas vou deixar Cairo para o próximo post. A primeira coisa que fiz foi me mandar para Giza. Não queria pegar tour fechada; peguei o metrô de Cairo à rodoviária de Giza. Fiquei meio chocado com o caos na chegada, pensando que deveria ter vindo numa tour, mas me achei pelo lugar. A próxima etapa seria descobrir a lotação que levava da rodoviária ao platô de Giza sendo que meu Árabe ainda não estava lá essas coisas.

Giza é a terceira maior cidade do Egito com cerca de 2.8 milhões de habitantes, na margem ocidental do rio Nilo uns 20 km ao sul de Cairo. O platô de Giza, próximo às ruínas de Memphis antiga capital do Egito Inferior e do Velho Reino (veja os posts introditórios do Egito), é a morada das três grandes pirâmides e da Esfinge, além de ruínas de vários outros mortuários, tumbas e templos, além de pirâmides menores das famílias dos respectivos faraós.

Saindo da rodoviária, um cara logo viu este turista perdido e se ofereceu para me levar; acertei um preço que sabia justo e nos mandamos. Ao chegar no platô notei que ele passou reto pela entrada enquanto falava ao fone; vi que ia rolar algo. Ele começou a dizer que tinha um amigo que faria um preço barato para me levar de camelo até as pirâmides perambulando por todo o sítio. Agradeci, disse que não queria; ao chegar no seu amigo ele veio com o papo de que era impossível entrar à pé pelo platô e por lá se locomover, e que na entrada eu ia acabar pagando mais caro para outro cara. Perdi a paciência, falei pro cara que não queria o camelo de seu amigo, dei a grana acertada e caí fora do carro. A caminhada demorou um pouco mas cheguei finalmente ao platô. E sem camelo entrei.

No album abaixo, entre a cidade e o deserto, todo o complexo do platô de Giza onde obviamente se sobressaem a Esfinge e as três maiores pirâmides do Egito: Khufu (Quéops, 2589-2566 AC, 147 m), Khafra (Quéfren, 2558-2532 AC, 144 m) e Menkaura (Miquerinos, 2532-2503 AC, 65m). Pagando-se um ticket extra, tem-se acesso à câmara real de Khufu. Não resisti e paguei; a câmara é isso, uma câmara, o jóia mesmo é subir ali por dentro. Como esses caras construíram aquilo há 4500 anos? Não fui visitar as vizinhas ruínas de Memphis, a pirâmide Doser em Saqqara e outros menores monumentos; para isso precisaria de um camelo.



Assim como em Luxor, eu gostaria de saber o que o governo faz com a FORTUNA que se arrecada com o turismo em Giza pois a cidade também tem regiões miseráveis. E assim finalmente eu conheci as Pirâmides do Egito, além dos Templos e Vale dos Reis em Luxor! Velho e Novo Reinos, e as capitais do Egito Superior e Inferior. Infelizmente não iria conhecer os pontos mais extremos do país, Aswam e Alexandria; era hora de retornar a Cairo, última cidade de meu inebriante giro de sete meses. No fim do dia, consegui descobrir a lotação que levava de volta à rodoviária de Giza; bom, passou uma van com um cara gritando e eu me joguei dentro dela.

Luxor, os eternos monumentos do Novo Reino do Egito  

Posted by carlos in

Depois da decisão errada de trajeto mencionada no post anterior, cheguei a Luxor. Para confirmar que minha nuvem negra se apaixonara de vez por mim. O albergue que tinha em mente estava lotado, e fui parar neste hotel mais barato. O lugar era normal, mas o quarto em que fiquei era ao lado de uma ruela super barulhenta, impossível de dormir antes da 1 am, e às 5 am tocavam os autofalantes com as preces Islâmicas do nascer do Sol, que aliás ficavam na mesma ruela.

Mas o pior foi que devo ter pego uma insolação em Dahab por ter ficado muito tempo morcegando ao sol. E talvez pego o mal-estar que assola muitos dos turistas pelo calor insuportável de Luxor. E isso por que era inverno; não quero nem imaginar o que é aquela cidade e o país no verão. Fiquei mal mesmo, a cabeça doía sem parar por todos os dias que lá fiquei, e o corpo estava um caco; não conseguia dormir, embora fosse à farmácia me dopar de remédios. Mas o dia de meu vôo se aproximava, eu tinha que levar a situação de qualquer forma para tentar aproveitar o mínimo.

Luxor, surgida às margens do Nilo e ao redor do sítio da antiga Tebas capital do Egito Superior e do Novo Reino (veja os posts introdutórios do Egito), hoje tem cerca de 500 mil habitantes. Não seria exagero dizer que se trata do maior museu a céu aberto do planeta. Tebas era a cidade dedicada ao deus-sol encorporado no faraó, Amon-Ra, sua esposa Mut e o filho Montu. Do lado ocidental do Nilo fica a Necrópolis, com o Vale dos Reis além do Vale das Rainhas e de Deir el-Medina (a vila dos trabalhadores); no Vale dos Reis foi descoberto quase intacto em 1922 a tumba de Tutancamon, cujas relíquias haviam percorrido o mundo e felizmente estavam em exposição no Museu do Cairo à época. Do lado oriental ficam os soberbos Templos de Karnak e Luxor, que distam poucos quilômetros entre si; no festival de Opet uma estátua de Amon descia o rio de Karnak a Luxor, onde se juntava a uma estátua de Mut, celebrando as cheias e a fertilidade do Nilo.

A maior parte da cidade de hoje fica no lado oriental do rio, inclusive rodoviária, ferroviária, e o hotel em que fiquei. Não é dificil se locomover aos Templos por conta própria. Porém, para ir à Necrópolis no lado ocidental é mais complicado; pode-se cruzar o Nilo com as balsas públicas a partir de algum dos Templos que ficam à sua margem, porém do outro lado seria preciso contratar um taxi até o Vale dos Reis se se quiser conhecer outros dos principais monumentos, que são mais espalhados. Quase inevitavelmente é preciso pegar uma das infinitas tours que têm um certo roteiro programado; umas cinco tumbas pelo Vale e outros Templos mais espalhados.

No primeiro album, fotos da tour que peguei pelo lado ocidental. Lembro que estava hiper-mal, os outros caras da tour hora ou outra perguntavam se eu estava bem e tal. Mal conseguia caminhar pelas tumbas; fotos não eram permitidas em seus interiores, infelizmente. As fotos cobrem o Colosso de Memnon (ruínas do Templo de Amenhotep III), o obrigatório Templo de Hatshepsut encravado na montanha rochosa, além de fotos avulsas entre o Vale dos Reis e o Vale das Rainhas; no retorno, tomamos uma balsa para a travessia do Nilo.



Nesse segundo album o foco é o lado oriental, com fotos apenas do Templo de Luxor. Como minha nuvem era das boas, quando fui ao Templo de Karnak pouco mais ao norte a bateria da câmera arriou, e eu ainda estava tão mal que apenas dei uma olhadela rápida e fui embora; o corpo inteiro latejava. Eu deveria ter invertido a ordem, pois Karnak é maior além de ter os recintos específicos de cada ente da trindade Amon-Mut-Montu, o de Amon obviamente dominando; as imagens da mitologia Egípcia, principalmente Osíris, Ísis, Horus, Anubis e Hathor, são uma constante em ambos os Templos.



Mas teve algo que me deixou chateado na atual Luxor. Indo além de uma ou duas ruas principais a cidade é paupérrima (inclusive na área do hotel); passa aquela sensação de o lugar não ter sequer governo. Isso deveria ser inadmissível dada a FORTUNA que se arrecada nos sítios arqueológicos. Eu realmente gostaria de saber para onde vai todo aquele dinheiro.

Se isso não bastasse, o próprio guia da tour do primeiro album comentou o fato que descobriu-se recentemente outro vasto sítio com inúmeras tumbas, sobre o qual várias casas existem; o governo havia dado um limite de tempo para que as famílias se mudassem por conta própria (sem fornecer outras casas) mas elas se negaram a sair, e o governo já vinha ameaçando simplesmente demolir as casas de uma vez. Afinal, deixando a ingenuidade de lado, aqueles sítios valem uma fortuna não apenas do ponto de vista arqueológico.

Eu tinha em mente ir mais ao sul, até Aswam, ver as maravilhas dos Templos de Abu Simbel de Ramsés II. Mas o tempo estava realmente curto, ainda havia Giza e Cairo, e o jeito foi cortar Aswam do roteiro; o mesmo tive que fazer com Alexandria do outro lado do país. Inacreditavelmente, quando cheguei a Cairo, minha saúde estava plenamente refeita. Mas antes de Cairo, vamos a Giza no próximo post.

A riviera do Mar Vermelho em Dahab, no Sinai  

Posted by carlos in

Depois da recente epopéia para ir de Petra a Dahab, finalmente cheguei. E como valeu a pena!

Dahab fica no sudeste da Península do Sinai, no Golfo de Aqaba já às portas do Mar Vermelho, de onde inclusive é visível a Arábia Saudita do outro lado do Golfo. É uma das cidades que fazem parte da chamada Riviera do Mar Vermelho. Era inicialmente uma vila pesqueira de Beduínos, e hoje é praticamente toda voltada ao turismo, e renomada pelas atividades de mergulho em suas águas repletas de corais e por todos os esportes aquáticos; aqui fica o Buraco Azul, tido como o sítio de mergulho mais perigoso do planeta, 40 mortes já contabilizadas em 130 metros de profundidade traiçoeira. Dahab foi conquistada junto com todo o Sinai por Israel na guerra de 1967, retornando a mãos Egípcias em 1982.

O lugar é realmente belíssimo e, depois de toda a tensão vivida em Jerusalém e na travessia da fronteira em Eilat, eu queria mesmo um lugar desses. Mas dei sorte em algo; fiquei num quarto-albergue que era parte deste resort super luxuoso, pagava-se preço de mochileiro e podia-se curtir todas as dependências do lugar, acho que só o café da manhã incluído seria mais caro que a diária que paguei!

Ficar dias a esmo curtindo o Mar Vermelho, sol, água e areia. E ainda com toda aquela exótica paisagem e as montanhas da península fazendo quase que um escudo ao litoral. Era baixa temporada quando eu estive por lá, estava bem calmo; há infindáveis restauratnes, bares, lojas, tudo num espaço relativamente curto. Mas dá para imaginar que na alta temporada o lugar fique abarrotado. O que é bom para todos os vendedores de lá, inclusive para as crianças Beduínas que ficam andando para cima e para baixo vendendo artesanato parte do dia; há uma vila de Beduínos mais ao sul e era triste ver suas crianças trabalhando assim, mas me animava quando via que elas passavam outra parte do dia brincando pelas praias mais afastadas.

O Monte Sinai fica próximo de Dahab. Só dá para ir em excursões, e caras. Eu acabei decidindo ficar pelas praias mesmo; sei que perdi paisagens únicas daquelas montanhas todas. O album abaixo mostra essa linda parte do planeta. Praias cristalinas, montanhas mais que pitorescas ao fundo, uma mistura bem diferente mesmo. 'Roubei' umas fotos daquelas crianças; de uma delas eu comprei as únicas lembranças materiais que trouxe dos 42 países de meu giro, garantia de que não vou esquecer o que aquele lugar e seu povo me fizeram sentir. Tão inesquecíveis quanto o pôr-do-sol no Sinai.



De Dahab, de alguma forma eu iria parar em Luxor. Haviam duas maneiras: uma mais curta, parte do trajeto pegava uma balsa da ponta da Península e cruzava o Golfo até o continente; outra mais longa, contornava a Península indo ao norte para depois descer até Luxor. A segunda era metade do preço, e como já havia gasto demais com tudo o que me ocorreu pelo Oriente Médio, foi a escolhida. Novamente, a decisão errada; foi a viagem mais aterradora que fiz em todo meu giro. Não saberei descrever; se estiveres por lá algum dia, pague mais caro, mas pegue o outro trajeto.

Uma saga em 20 km de fronteira, perseguição em Israel  

Posted by carlos in

Muito bem, depois dos dois últimos posts sobre história, hora de conhecer o Egito! Primeira parada: Dahab, no sudeste da Península do Sinai. Sem antes outra trivial demonstração da mentalidade Israelense (aqui também!?). E a nuvem negra que ganhei em Jerusalém não parava de me seguir.

Para ir de Petra ao Egito é preciso pegar um ônibus até a cidade de Aqaba, ainda na Jordânia, que fica na esquina de terra onde se inicia o Golfo de Aqaba que, junto com o Golfo de Suez, delineiam a Península do Sinai. Em Aqaba o plano inicial era pegar um barco que fazia a travessia daquele Golfo até terras Egípcias, dessa forma evitando pisar em Israel de novo dar mais de meu dinheiro a esse estado doente. Mas fiquei sabendo que tal barco era super incerto, sem horários confiáveis, nada garantido; e só me restavam poucos dias antes do vôo de retorno.

Acabei me convencendo a mudar de idéia, e o único caminho por terra era cruzar os 20 km Israelenses que ficam à margem do Golfo de Aqaba passando-se por sua única cidade, Eilat. Como eu já havia entrado em Israel antes, pensei que os trâmites na fronteira dessa vez seriam simples; na primeira entrada, eu até que estava meio receoso por haver uma 'carta-protesto' que eu escrevi em 2006 após a selvageria covarde Israelense no Líbano e que enviei para zilhões de emails, e que acabou saindo em dado site Árabe (sem contar a estampa Síria em meu passaporte). Como foi tudo normal daquela vez, não deveria haver problema agora, e peguei assim uma lotação de Aqaba até a fronteira de Israel.

Dessa vez porém, e mesmo após eu ter dito que só iria cruzar os míseros 20 km da costa do país sem nem mesmo pernoitar em Israel, a bela garota do exército, depois de me fazer esperar um longo tempo enquanto consultava alguem ao telefone, retornou perguntando-me se por acaso eu era escritor... ; respondi que não, mas que gostava de escrever textos e enviá-los mundo afora quando via situações inaceitáveis que mereciam meu interesse (além de gostar de expressar minha opinião como enfaticamente o fiz nos posts de Israel e Palestina neste blog). Ela voltou ao telefone e me pediu para sair. Algumas horas depois, a beldade de farda me chama de volta, devolve o passaporte e diz que eu tinha 24 horas para deixar o país.

Entendi o recado. Paguei àquele Estado fascista mais uma vez, e ainda tive que pagar um táxi da fronteira até a rodoviária de Eilat, onde pegaria um ônibus até a fronteira Egípcia, para lá pegar outro a Dahab. Mas eis que, muito coincidentemente, enquanto estava eu à espera na rodoviária, vejo a beldade de farda pelo saguão, que aliás percebeu quando eu a reconheci. Pensei comigo: é mesmo impressionante como essas coincidências acontecem, estarmos assim no mesmo lugar de novo. Mas adoraria saber o que teria acontecido se eu não tivesse pego aquele ônibus... .

Quanta coisa pode acontecer em 20 km por esse lados. Ao tentar entrar no Egito, me disseram que a taxa do visto era muito mais cara ali (para quem tira no aeroporto é barato), e eu ainda teria que pagar uma segunda taxa se eu fosse sair da área do Sinai, por ser aquela uma zona especial. Fiquei com a quase certeza que os caras estavam querendo me extorquir, mas voltar a Israel é que não podia. Paguei a fortuna. Como o trâmite em Israel demorou muito, já não havia mais gente cruzando a fronteira para ocupar as lotações saindo da fronteira. Fui obrigado a pagar outra fortuna e ir sozinho numa lotação até Dahab.

Perdi o dia inteiro, paguei uma fortuna a Israel, ao Egito, e à lotação. Minha nuvem negra era mesmo poderosa. Por que cargas d'água eu não peguei o maldito barco? Mas vamos a Dahab então, tentar se 'lavar' nas águas do Mar Vermelho.

Egito, cinco mil anos de história a nos espreitar, parte II  

Posted by carlos in

(...continuação)

No período que se estende do fim do Novo Reino em 1070 AC até a conquista de Alexandre O Grande em 332 AC (que veio a fundar Alexandria no Mediterrâneo), o Vale dos Reis deixou de ser a morada mortuária dos faraós e o país viu nova descentralização; ele engloba da vigésima primeira à trigésima primeira dinastias, muitas delas de origem estrangeira, dos países que ocuparam o Egito, a trigésima sendo a última dinastia de um faraó local (Nectanebo II, 360-343 AC).

Começou então a dinastia Ptolomaica, cuja capital era Alexandria e que durou de 305 a 30 AC, quando o Egito se tornou província de Roma; essa dinastia foi iniciada por Ptolomeu I e terminada por Cleópatra VII, a qual governou de 51 AC até seu suicídio em 30 AC. Cleópara era amante do ditador Romano Júlio Cesar e tinha um caso com o general Romano Marco Antonio; quando Júlio os desmascarou foi assassinado em 44 AC, e na sucessão ao trono Marco foi derrotado por Otávio, herdeiro de Júlio, que viria a se tornar o imperador Otávio Augusto; Cleópatra se suicidou, e sua dinastia Greco-Macedônia perdeu o Egito que caiu sob controle Romano.

O controle Romano durou de 30 AC até 639, tendo passado ao império Bizantino em 395 após a divisão de Roma; foi nesse período que surgiu a igreja Cóptica Ortodoxa em 451, e o domínio Bizantino acabou fazendo com que o Grego em vez do Latim, além do Egípcio, fosse usado. A conquista Árabe ocorreu em 639 e seu domínio durou até 1517, período em que o Árabe foi disseminado dando origem ao atual dialeto Árabe-Egípcio e o Islamismo Sunita se instarou no país; nesse mesmo período, vários foram os ataques Cruzados e estima-se que a peste negra tenha matado cerca de 40% da população no século XIV. Finalmente veio o domínio Otomano que se estendeu de 1517 a 1802, ano em que as tropas de Napoleão que haviam aportado no país foram expulsas e o general Otomano de origem Albanesa Muhhamad Ali Pasha tomou o controle nacional.

Embora o domínio Otomano oficialmente tenha durado até seu fim na primeira guerra mundial, a dinastia de Ali Pasha governou de forma autônoma o Egito até 1882, quando o país foi invadido pelo Reino Unido. Essa dinastia trouxe uma maior modernização ao país, fez muitas obras como o Canal de Suez concluído em 1869, mas estas trouxeram enorme endividamento, o que acarretou a invasão Inglesa cujo domínio se estendeu até 1952, época em que a dinastia Ali Pasha se tornou um governo-fantoche.

A revolução Egípcia de 1952 comandada por Nasser foi causada pela grande revolta contra os privilégios da dinastia e dos Ingleses, e contra a Partilha do Canal de Suez proposta para o pagamento da dívida. A República do Egito foi proclamada em 1953 e Nasser assumiu a presidência em 1956, ano em que ele nacionalizou o Canal de Suez. Morto em 1970 foi sucedido por Sadat, que mudou de lado na Guerra Fria passando a apoiar os EUA em vez dos Soviéticos. Assassinado em 1981, foi sucedido pelo atual presidente Mubarak, do partido único que comanda o país.

Depois de eu aprender mais de sua história, hora de chegar na primeira parada no Egito, a paradisíaca Dahab no Sinai.

Egito, cinco mil anos de história a nos espreitar, parte I  

Posted by carlos in

Antes do turismo no país das pirâmides e faraós vou me arriscar a uma recapitulação das fases da história Egípcia, até para se contextualizar seus monumentos milenares. Hoje em dia, são cerca de 80 milhões de habitantes, 90% Sunitas e a maior minoria sendo de Cópticos Ortodoxos; 99% da população mora em 6% do país, ao redor do Rio Nilo, o resto ficando com os desertos do Saara e da Líbia.

No período pré-dinástico (antes de 3000 AC) culturas neolíticas se instalaram às margens do Rio Nilo por volta de 6000 AC, e se desenvolveram independentemente no Egito Superior (sul) e Inferior (norte); três delas, Badaria, Naqada e Merimda, são tidas como precursoras do Egito dinástico. Durante cerca de três mil anos as tribos do Egito Superior e Inferior evoluíram e entraram em contato esporadicamente. A história do Egito Antigo começa com sua unificação ao redor de 3150 AC, sendo o Rei Menes tido como o responsável; o Egito Inferior, capital Memphis, ruínas próximas à Giza, e o Superior, capital Tebas, pelo sítio da atual Luxor. Menes iniciou uma série de dinastias que percorreram os três mil anos seguintes.

Após a segunda dinastia começa o chamado Velho Reino (2680-2150 AC), que engloba da terceira à sexta dinastias e cuja capital era Memphis. Esse talvez seja o período mais popular hoje, em que pirâmides eram construídas como os locais de sepultamento dos faraós. As mais famosas são a pequena Djoser (2668-2649 AC), em Saqqara, de um faraó da terceira dinastia e construída por seu vizir Imhotep; mas principalmente, as três pirâmides em Giza, há cerca de 30 km de Saqqara, construídas por faraós da quarta dinastia: Khufu (Quéops, 2589-2566 AC), a Grande Pirâmide, de 147 metros; Khafra (Quéfren, 2558-2532 AC), apenas 3 metros mais curta; e Menkaura (Miquerinos, 2532-2503 AC), a menor de todas com 65 metros. A Esfinge também foi supostamente construída por Khafra. Essas obras são testemunhas de quase 5 mil anos do poder faraônico de outrora.

Entre 2150 a 1550 AC os faraós viram certa decadência por lutas internas, desunião entre Egito Superior e Inferior, pragas naturais, e invasão dos Hicsos. Esses seis séculos viram passar da sétima à décima sétima dinastias, a capital ser transferida para Tebas e os primeiros faraós serem sepultados no Vale dos Reis; nesse período também houve o chamado Médio Reino onde os faraós viram uma relativa recuperação.

O Novo Reino (1550-1070 AC) engloba da décima oitava à vigésima dinastias, e testemunha o apogeu Egípcio que chegou a se estender até a Núbia ao sul (3/4 de seu reino ficavam no norte do atual Sudão) e ao Oriente Médio após batalhas contra os Hititas. Com a capital em Tebas, nele se construíram os hoje imperdíveis Templos de Luxor e Karnak. Os mais conhecidos faraós são do Novo Reino: Hatshepsut (mulher, cujo fabuloso templo mortuário se localiza ao lado do Vale dos Reis), Tutmés III, Amenhotep III, Amenhotep IV (que mudou seu nome para Akenaton) e sua esposa Nefertiti, e Tutancamon (filho de Akenaton e que nasceu Tutancaton), todos da décima oitava dinastia. Da décima nona, Ramsés II e sua esposa Nefertari, tido como o mais poderoso dos faraós (Moisés o conheceu bem, para quem acredita nessas coisas); é deste faraó o templo mortuário Ramesseum na área do Vale dos Reis e os monumentais templos talhados na montanha em Abu Simbel, que foram removidos em 1960 quando da construção da barragem formando o Lago Nasser em Aswan. A vigésima dinastia, incluindo de Ramsés III (que possui outro enorme templo mortuário pelo Vale dos Reis) a Ramsés XI, dentre outros, viu um gradual enfraquecimento do Egito faraônico até que ele veio a ser atacado continuamente por Líbios, Núbios, Persas, Macedônios e Assírios.

(continua...)

Petra, inacreditável esplendor Nabateu  

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Chegar a Petra foi uma epopéia. Depois de pagar caro para sair de Israel ainda não acreditando em toda a ironia que passei em Jerusalém, e chegar numa lotação até Amã (felizmente não é preciso pagar de novo para reentrar na Jordânia), fui reto à sua rodoviária naquele fim de tarde pois achava que havia um ônibus ainda. Ledo engano, e perdido por lá tive que pagar um taxista para me levar ao centro da cidade onde acabei passando a noite no mesmo hotel de minha estada anterior na cidade. Na manhã seguinte, peguei o primeiro ônibus e quando estávamos há cerca de 20 km de Petra, uma espessa neblina tomava conta de tudo e a estrada fora fechada. O motorista simplesmente deu meia volta e retornou a Amã, dizendo que não podia ficar incertamente esperando abrir a estrada.

Felizmente, conheci no ônibus uma garota Jordaniana, Rhuda, que trabalhava no turismo em Petra e tinha que chegar na cidade de toda forma naquele mesmo dia. No retorno a Amã, ela sabia que havia outra rodovia que ligava Amã a uma cidade próxima de Petra, e outra empresa que fazia aquele percurso; eu grudei nela pois nem em pesadelo eu perderia outro dia em Amã, e assim nos mandamos pra estrada de novo. Conseguimos chegar naquela cidade já de noite, e rachamos então um táxi até Petra; conforme chegávamos perto, a neblina não deixava enxergar quase nada pela pista no meio do quase-deserto; mas o taxista foi firme e, de pouco em pouco, finalmente chegamos em Petra. Eu só não sei como aquele cara enfrentou a pista para ir embora.
De brinde, ganhei a amizade de Rhuda para tomar um suco no dia seguinte. Aliás, achar bebida alcólica por esses lados não é tarefa fácil! Eu não imaginava que fosse tão rígido assim, excetuando-se cidades mais liberais como Beirute. O sítio de Petra fica ao lado da pequena Wadi Musa, onde fiquei nesse hostel; dois quilômetros ao sul há um povoado Beduíno, os quais já não são mais tão nômades assim mas mantêm a mesma estrutura tribal de seus antepassados.

Petra! A capital dos Nabateus, cidade toda esculpida na rocha entre as montanhas de Wadi Araba, o grande vale que se estende do mar Morto ao mar Vermelho. Foi a habilidade de coletar, canalizar e distribuir água que garantiu a sobrevivência dessa cidade de pedra; diques, cisternas e dutos a abasteciam, numa improvável engenhosidade hidráulica. A erosão pelos séculos apagou parte das construções rochosas e praticamente não restam inscrições originais em parte alguma, dando ainda maior ar de mistério à cidade. Vestígios indicam que a cidade começou a se formar ao redor do século VI AC, época em que os Edomitas habitavam a região, mas a maior parte dos monumentos em Petra data dos séculos I AC a I DC, de estilos Grego e Romano. Há mais recentes, refletindo posteriores ocupações Bizantinas e Otomanas. Petra permaneceu uma 'cidade secreta' ao mundo ocidental até 1812, quando o explorador Suiço Burckhardt a redescobriu; mais recentemente ela foi pano de fundo de vários filmes, o mais conhecido claro sendo Indiana Jones.

Seus primórdios ainda não são claramente conhecidos. Os Nabateus eram um povo Árabe, que falavam Aramaico e cultuavam divindades pré-Islâmicas como o deus Dushara, que é representado em algumas das ruínas mais antigas de Petra. Entre os séculos VI-II AC estudos mostram que suas primeiras tumbas se dividem em dois tipos principais: um Grego-Romano, outro Egípcio-Nabateu. Ao fim do século II AC dois dos reinos sucessores do império de Alexandre, os Ptolomaicos e os Selêucidas, estavam enfraquecidos e os Nabateus começaram a prosperar, mesmo após serem anexados por Roma ao redor de 106 AC. Poucos são os sinais de novas construções pelos dois séculos seguintes, apontando para alguma catástrofe que danificou sua engenhosidade hidráulica ou mesmo para uma invasão estrangeira. A cidade entrou em declínio quando Roma passou a usar novas rotas de comércio que não mais a percorriam até cair em completo esquecimento, passando a ser alvo fácil de saqueadores de tumbas e monumentos. O Cristianismo ainda aportou em Petra no século IV, o Islamismo no VII, e alguns monumentos avulsos dessa época se encontram pelo sítio.

Após a entrada, um extenso (1200 metros) e estreito gorge (Siq, apenas 3 metros em alguns trechos) conduz ao Al Khazneh, ou Tesouro como é chamado, o mais conhecido monumento Nabateu construído entre os séculos I AC a II DC em estilo mais Grego. Seguindo adiante toda a misteriora cidade se abre. Chega-se a área do anfiteatro Romano e a avenida principal, cercada de tumbas inacreditáveis esculpidas na rocha das montanhas ao redor, principalmente no lado direito; seguem-se o Palácio de Petra, o Nimphaeum, o Arco, o Templo Qasr Al-Bint e o Templo do Leão Alado, e o museu no fim da avenida. Pelo lado esquerdo, escala-se a montanha até chegarmos ao Alto Palácio de Sacrifício, visão soberba, descendo depois até o Triclinium do outro lado. De volta ao museu começamos outra escalada até o topo de nova montanha, desta vez para vislumbrar o último e maior monumento de Petra, o Monastério Al-Deir. Não vou nem tentar descrever a visão que se tem de lá; alcança boa parte de Wadi Rum, o Vale da Lua aonde minha idéia era passar uma noite entre suas montanhas, numa tenda Beduína, algo que aliás tem se tornado comum a alguns turistas. Mas à noite o frio naquela época estava insuportável, e acabei não me dando essa experiência.



Gastei dois dias em Petra. No primeiro (album acima), da entrada até o Tesouro e do anfiteatro subindo a montanha pelo lado esquerdo até o Alto Palácio de Sacrifício; há umas fotos da pequena Wadi Musa. No segundo (album abaixo), a partir do anfiteatro indo às Tumbas do lado direito, voltando à avenida principal até subir a montanha ao Monastério; há umas fotos na pista do vale de Wadi Rum.



Achei legal que o sítio de Petra possui vários Beduínos a tirar algum sustento do local. Subindo as montanhas, hora ou outra você depara com algum, vendendo alguma coisa e sempre oferendo um chá; sem contar aqueles que levam turistas, à cavalo, montanha àcima. É um povo diferente, aquele ar de mistério de quem conhece os segredos do deserto. Para além do Monastério, já quase caindo nos precipícios de Petra, fiquei um tempão curtindo um chazinho numa cabana tendo toda aquela visão impagável diante de mim. Não quis nenhuma carona, estava a fim de andar em paz por aquele santuário. E também não tirei foto em camelo!

Mais que satisfeito por ter conhecido essa maravilha do planeta, era hora de partir para o último país, Egito. Estava digerindo a ironia de Jerusalém, e mal sabia que Israel iria me dar outra dor de cabeça na fronteira.

Palestina, ocupação e Apartheid do fascista Estado Israelense, parte II  

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(...continuação)

Mas a ironia é mesmo Dantesca. Fui até o lado Palestino justamente por me sensibilizar muito com o Apartheid que eles sofrem; inicialmente fui caminhar cerceando o Muro da Separação, que simplesmente corta povoados ao meio fazendo antigos vizinhos terem que se locomover quilômetros até um checking point para poderem se rever, quando Israel permite. A idéia em seguida era conhecer algumas cidades, Ramallah, Belém, Jericó, Nablus ou Hebron, e conhecer algumas das colônias que os Judeus constroem em terras tomadas de Palestinos, muitos deles sendo novos imigrantes vindos principalmente dos EUA; ver mais de perto a humilhação diária que essa etnia sem nação é obrigada a suportar debaixo de fuzis fascistas, sendo inclusive podada do mais simples direito de ir e vir.

A ironia veio pouco antes de cruzar o checking point; saindo da Casa da Paz caminhei ao Monte Scopus, próximo ao Monte das Oliveiras, que fornece uma triste visão panorâmica de boa extensão do Muro da Separação. É impressionante; corta rodovias, sobe por montanhas, perde-se no horizonte. Uma jaula de centenas de quilômetros. Eis que surge um Árabe, senta-se ao meu lado, começa a falar em sinais (o cara parecia meio drogado) e aos poucos se aproxima. Apesar de eu já ter sido estúpido o bastante em Istambul quando caí numa armadilha para turistas (está em algum dos posts Turcos), eu me prometi que não iria entrar na paranóia de se evitar pessoas que se aproximassem; se estou viajando também é para conhecer nativos.

Pois o cara pega minha câmera, enfia a mão no meu bolso e pega meu mp3, e sai correndo morro àbaixo. Desesperadamente desço correndo atrás do cara; eu só queria o cartão de memória da câmera pois não fazia backup das fotos há um mês, desde a Polônia, tendo passado depois por locais que provavelmente jamais voltarei a ver. Eu caí morro abaixo, arrebentei os óculos, o nariz... . Eu não podia acreditar; acho que nunca me senti tão deprimido daquela forma. Resultado: perdi o tempo que tinha para conhecer cidades do lado de lá do Muro me recuperando, fazendo BO, arrumando outros óculos, procurando uma câmera barata pois ainda tinha Petra e Egito pela frente.

Para piorar Ibrahim, que ficou também muito chateado por saber que o cara 'era um dos seus', estava passando pela fase mais complicada desde que ele abriu sua Casa da Paz pois as doações não iam dar para pagar as contas do mês e sua pouca grana já se acabara. Claro que contribuí com bem mais do que esperava, e tentei fazer ele aceitar que deveria passar a cobrar uma diária simbólica (um preço de albergue). Quando estive lá vi como a bondade do cara é explorada por alguns mochileiros mal-intencionados: um grupo de 7 jovens e saudáveis americanos ficou 8 dias hospedado (foram embora no dia que cheguei), comendo de tudo; na despedida deles, Ibrahim preparou um baita jantar e no dia seguinte os filhos da puta tiveram a coragem de dar 100 dólares no total (50 centavos por pessoa por dia); depois chegou um grupo de Coreanos, todos com seus notebooks, que estavam indo pelo mesmo caminho. Sei que a Casa ainda está na ativa, mas torço para que Ibrahim para de se deixar explorar daquela forma.



No album acima algumas fotos que Ibrahim tirou, da Casa, de parte da família, do local do roubo, de um rango ao Portão Damasco; recordações de minha fronte esfolada. E esses acabaram sendo meus dias em Jerusalém Oriental, sem West Bank, com novos amigos, um mês de fotos perdidas, e sem conhecer in-loco o lado de lá do Muro graças a um Árabe.

Era hora de voltar a Amã, na Jordânia, pegar um ônibus e descer para Petra, seguir viagem, onde veria que a nuvem negra me seguiria até o Egito. E ainda teria a experiência de ser seguido pelos fascistas ao cruzar novamente a fronteira de Israel ao ir de Petra ao Egito. Mas vamos por partes.

Palestina, ocupação e Apartheid do fascista Estado Israelense, parte I  

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Em Tel Aviv fiquei sabendo da Casa da Paz desse fantástico ser humano, Ibrahim, que ficava no Monte das Oliveiras em Jerusalém Oriental; ele mantém a Casa com base em doações dos hóspedes e prepara enormes refeições para os mesmos. Pois lá fui eu, e prontamente me indicaram sua Casa quando cheguei naquele Monte, que aliás fica próxima a um dos checking points Israelenses e do fascista Muro da Separação que esse estado Terrorista construiu. Ibrahim faz parte de um grupo, está aqui o site, que tenta promover o reconciliamento de Judeus e Palestinos.

Vale lembrar que Israel unilateralmente unificou em 1980 as partes oriental e ocidental de Jerusalém e considera a cidade unificada sua capital, enquanto os Palestinos querem a parte oriental como a capital de um futuro Estado; sem falar no status do quilômetro quadrado da antiga cidade murada, embora a comunidade internacional reconheça Tel Aviv como capital de Israel. O dinheiro do país, a fortuna que Israel recebia anualmente dos EUA e as volumosas doações de Judeus e simpatizantes mundo afora à causa Sionista foram muito bem empregados, sem dúvida construindo uma bela nação ao seu povo. Pena que se esqueceram de investir também do 'outro lado do mundo', cuja infraestrutura é imensamente mais precária; afinal, se Israel ocupa e considera toda Jerusalém como sua capital eu suporia que o dinheiro devesse ser investido por toda parte, sem propositalmente negligenciar bairros de maioria Árabe.

Além dessa degradação material, há também a moral. É impossível não ficar chocado com o policiamento ostensivo pelas ruas da cidade antiga, sem falar dos checking points desse ultra-militarizado Estado. Detalhe: o serviço militar é obrigatório para mulheres também; a cada momento você tromba com lindas garotas e rapazes carregando suas metralhadoras e fuzis automáticos, todos muito simpáticos com turistas. Certo dia me deparei com a situação que um Palestino deva ter que engolir diariamente: três jovens soldados e seus fuzis começaram a implicar com um cara em uma ruela mais afastada no setor Islâmico da cidade murada. Eu diminuí o passo. Os soldados puxaram o Árabe para outra ruela numa esquina, eu virei a esquina como quem nem sabe o que se passa. Esperei um pouco e retornei. O cara já estava pressionado na parede, com os soldados chutando suas pernas para que ele as abrisse a alguma revista enquanto falavam algo em tom jocoso entre si; pouco acima, umas crianças Árabes vendo toda a cena, aprendendo bem a lição (ou talvez aumentando o ódio a explodir quando crescerem).

E eu fui embora, não tive peito de ficar ali. Até penso que não devam ter feito nada de mais grave ao Árabe, mas essa humilhação moral cotidiana é o pior, essa forma covarde de manter uma etnia subjugada, frustada e sem poder reagir. Afinal, quando reagem aprendemos na grande mídia que não passam de terroristas e a desculpa perfeita para justificar ainda mais opressão. Pior que ser o 'povo escolhido' é sê-lo com fuzis nas mãos de garotas e garotos. E os adultos os treinando em alguns de seus locais sagrados, se foi o que eu vi direito certo dia. Israel é um estado doente. Mas é necessário dizer que também há muitos Israelenses, dentro e fora do país, que se sentem envergonhados com seu governo fascista e com o fundamentalismo-fanatismo Sionista, como provavelmente se sentiriam muitas das vítimas do Holocausto.

O conflito religioso é apenas fachada. Tudo não passa de uma elementar estratégia de conquista até que nem mais se justifique a criação de um Estado Palestino: ocupação, colonização, aumento demográfico, opressão, e assimilação; quem quiser ficar que fique e obedeça a quem domina, quem não quiser que vá embora e se torne outro refugiado. Sempre que preciso há o segundo exército mais poderoso do planeta para resolver qualquer problema. Palestinos são quase cidadãos de segunda categoria em Israel, e quase inevitavelmente recebem um salário menor do que o de um Judeu na mesma profissão.

Vale lembrar que a cidadania Israelense foi autorizada apenas aos Árabes que não fugiram nem foram expulsos em 1967, os quais não possuem qualquer direito de retornar à própria terra; os que ficaram, a minoria, podem requerer a cidadania desde que sirvam ao Exército, jurem lealdade a Israel e se recusem a qualquer outra nacionalidade. Nem precisa dizer qual a intenção por trás disso, e é obvio que a maioria dos Palestinos que até podem não requerem a cidadania do invasor; estes possuem uma carteira de identidade que os possibilita receber a graça divina de cruzar os checking points. E pensar que há pouco mais de 60 anos esse mesmo povo Judeu sofreu a pior calamidade da história; hoje a pratica.

(continua...)

Tel Aviv-Jaffa, a riquíssima capital Israelense  

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Vim a Tel Aviv para conhecer como é viver em Israel longe das áreas que o país ilegalmente ocupa na Palestina e longe da atmosfera de Jerusalém. Brincar de cego um pouco.

E deu para curtir bem suas belas praias no Mediterrâneo com muito sol, o que não foi possível em Beirute pelo clima que peguei lá. A cidade é ultra moderna, organizada, a mais cara do Oriente Médio, tipicamente uma cidade ocidental, além de uma população com um aspecto bem liberal. Há muita juventude pelas ruas e bares que aparentemente nem toma conhecimento do que se passa do 'outro lado do mundo'. Aparentemente. Eu adoraria ficar perguntando as opiniões das pessoas em cada conversa para ver o que se passa na cabeça delas por aqui, tão 'longe' (uns 60 km) de Jerusalém, mas é sempre complicado entrar nesse assunto assim de repente. Talvez apenas viver uma vida normal seja tudo com o que se interessem na maior parte do tempo; certamente é o mesmo o que os Palestinos gostariam de poder fazer do outro lado do Muro da Separação. Mas vim aqui descansar, deixar o lado conflitante lá em Jerusalém à qual voltaria depois. Fiquei nesse hostel.

Tel Aviv é a capital de Israel, seje das embaixadas internacionais, embora o governo nacional tenha deslocado suas sedes para Jerusalém (Knesset e demais prédios) e insista em considerá-la sua capital. Centro econômico e cultural do país com cerca de 400 mil moradores, Tel Aviv foi unificada à vizinha cidade antiga de Jaffa logo após a criação de Israel, em 1950. Ela foi fundada em 1909 quando um grupo de 60 imigrantes adquiriu terras Beduínas para construírem um novo povoado. Tel Aviv continuou um rápido crescimento com sucessivas ondas imigratórias de Judeus Europeus, enquanto Jaffa mantinha sua maioria Árabe. Foram essas ondas que a fizeram ser conhecida como Cidade Branca, por causa do maior aglomerado de prédios modernistas Bauhaus do mundo, já que elas também trouxeram os arquitetos que planejaram a cidade.

O plano de partição da ONU previa Tel Aviv para Israel, Jaffa para Palestina. Após a vitória de Israel na guerra de 1948 a maioria dos Árabes foi expulsa e Tel Aviv anexou Jaffa. Depois de certa estagnação nos anos 80, os anos 90 viram nova onda imigratória Soviética por causa do fim do Comunismo e a cidade se consolidar como centro de alta tecnologia, com inúmeros novos arranha-céus e um rejuvenescimento da população cuja média de idade é hoje de 34 anos; 92% dos habitantes são Judeus de todas as subdivisões, e há esporadicamente certas tensões entre os mais seculares e os mais ortodoxos.

Por sua vez, Jaffa é mencionada desde épocas Egípcias, inclusive na bíblia como sendo o porto pelo qual chegou a madeira vinda do Líbano para a construção do templo de Salomão em Jerusalém. Tendo passada por mãos Gregas, Romanas, Árabes, e muito visada durante as Cruzadas por causa de seu porto, Jaffa viu seu maior desenvolvimento sob o domínio Otomano e cresceu após a primeira onda imigratória (Aliyah) Judia em fins do século XIX resultante da formação do movimento Sionista internacional.

Devo confessar que acabei passando a maior parte do tempo na praia, vasculhando o promenade, e a noite ia para alguma das áreas com bares. Pegava o transporte público para conhecer alguns dos distritos mais modernos. Das típicas principais atrações vale a pena se perder pelo Boulevard Rothschild que corta a cidade de norte a sul e pela rua Allenby, a praça Estrela de Davi e o mercado Carmel, a torre do Azrieli Center com sua ultra panorâmica de toda a cidade, a Grande Sinagoga e a praça Rabin, onde o mesmo foi assassinado em 1995 e onde fica o town hall, sem contar os diveros museus, teatros. E claro, ir até a área do porto antigo em Jaffa, conferir a Otomana Torre do Relógio e a mesquita Hassan Bek, a igreja Franciscana de São Pedro, a igreja Protestante Immanuel, o farol e as ruínas de um Forte Cruzado.

AVISO: Tel Aviv é a décima terceira cidade cujas fotos se perderam no assalto que sofri em Jerusalém (detalhes no post daquela cidade, posterior); perdi um mês de fotos sem backup. Para não ficar só na descrição, seguem abaixo alguns links da net, fotos de terceiros.

http://www.israelinphotos.com/gallery4-Tel-Aviv-Jaffa.htm
http://www.tripadvisor.co.uk/LocationPhotos-g293984-Tel_Aviv.html
http://www.trekearth.com/gallery/Middle_East/Israel/Tel_Aviv/
http://search.pbase.com/search?q=Tel%20Aviv



Foi mesmo providencial esse relaxamento em Tel Aviv, confirmar a fartura com que se vive por esses lados. Era hora de retornar a Jerusalém Oriental e ir conhecer os Territórios Ocupados. O ácido ia fluir. E o destino se mostrou irônico.

Jerusalém, capital de dois mundos  

Posted by carlos in ,

Depois da parte histórica do post anterior, e deixando a parte ácida para os posts da Palestina, vamos enfim conhecer Jerusalém!

Vindo de Amã os ônibus só vão até a fronteira pois os trâmites para se entrar em Israel são sempre demorados e variam de pessoa a pessoa. No meu caso, por ter estampa Síria e Libanesa no passaporte, pior ainda; fiquei lá um tempão, o lugar enchia e esvaziava, e nada; depois de umas quatro horas de espera e algumas perguntas, me liberaram. Não se paga para entrar no país, mas paga-se bem caro para sair. Passados os trâmites pega-se outro ônibus até Jerusalém, onde fiquei neste hostel em que não ficaria de novo, à saída do Portão Damasco próximo da rodoviária Islâmica. O trajeto já é por si só bem jóia, passando ao largo do mar Morto e das pitorescas formações montanhosas daquela área semi-desértica.

Jerusalém está encravada na divisa entre West Bank na Cisjordânia ocupada e Israel. A cidade seria a maior de Israel se se incluísse seu lado oriental, o que daria cerca de 800 mil habitantes em cerca de 125 km^2, 2/3 Judeus e 1/3 Árabes. O centro antigo, a cidade murada de 1 km^2, está no coração das três religiões monoteístas que o ser humano infelizmente inventou: para os Cristãos a igreja do Santo Sepulcro foi erigida no local das supostas crucificação e tumba do suposto Jesus; para os Muçulmanos, o Domo da Rocha no Monte do Templo guarda em seu centro o local por onde Maomé subiu aos céus; para os Judeus, o Muro das Lamentações é o que restou de seu segundo Templo destruído pelos Romanos e sobre o qual foram construídos o Domo da Rocha e a mesquita al-Aqsa (nesse Templo ficariam a Arca com os dez mandamentos de Moisés e o local onde Abraão preparou seu filho Isac para o sacrifício-prova de obediência a deus).

A cidade antiga, que até 1860 era tudo o que existia na área, consiste de quatro setores: Islâmico, Judeu, Armênio e Cristão. O Islâmico é o maior e mais populoso, com seus típicos bazares por ruelas estreitas, lar de 22 mil pessoas. O Cristão, também lar de alguns Gregos Ortodoxos, Franciscanos, Beneditinos e Luteranos, além de diversos monastérios e igrejas como a Luterana Cristo Redentor contém o Muristão, um local de muitas lojas e alguns restaurantes. O Armênio é o menor de todos, onde vivem cerca de 2 mil pessoas e fica o monastério de São Jaime. E o Judeu, que teve muitos sítios como a sinagoga Hurva destruídos durante o domínio Jordaniano (1948-1967), e hoje com vastos recursos está todo reconstruído (Hurva estava sendo reinaugurada quando eu estive por lá), e que possui cerca de 3 mil moradores e vários sítios arqueológicos inclusive subterrâneos. Vale lembrar que ainda em 1967, logo após a guerra dos seis dias, Israel destruiu e expulsou os moradores do que era o quinto e menor setor, o Marroquino, que existiu por oito séculos desde os tempos de Saladin, para dar lugar ao que hoje é a praça aberta em frente ao Muro das Lamentações.

Além desses principais locais já mencionados, há uma infinidade de outros a se visitar na cidade murada, aonde se entra por algum dos sete Portões ainda em funcionamento. Por exemplo: a torre e citadela de Davi, perto do Portão Jaffa, construídos no século II AC sobre ruínas que remontavam ao tempo de Davi; a Via Dolorosa, o caminho de Jesus até a Crucificação, que começa pelo Portão do Leão e passa pelas nove estações da cruz, com as outras cinco estações ficando dentro da igreja do Santo Sepulcro (igrejas e outros monumentos foram erigidos demarcando cada estação); e deixar-se perder por entre as ruelas dos setores, e pelos bazares do lado Islâmico, parando cada dia para comer e beber em um setor! Achei curioso que cada prédio histórico seja tutelado por uma dada instituição religiosa.

Fora da cidade antiga, mas ainda no complexo histórico que avança pelo lado oriental, são obrigatórios: o Monte Zion, com a abadia Hagia Maria Zion, o local onde supostamente foi realizada a última ceia e o local da suposta tumba do rei Davi; o Jardim da Tumba, local que para muitos é o verdadeiro suposto local da crucificação do suposto Jesus, bem próximo à sua suposta tumba na pedra; a Cidade de Davi, o local mais antigo de todos, hoje um enorme sítio arqueológico que remonta aos tempos de Davi e onde supostamente seu palácio ficaria; diversas tumbas cavadas na rocha no vale entre o Monte do Templo e o Monte das Oliveiras. E acima de tudo, subir pelo Monte das Oliveiras. Pela sua base ficam: o Gethsemane, o jardim onde supostamente Jesus passou sua última noite e ocorreu a traição do pobre Judas, bem próximo à suposta tumba de Maria; as recentes igrejas católica Todas As Nações e ortodoxa Russa Maria Madalena, além de outras igrejas. Subindo-o há toda uma necrópole já quase ao topo e uma visão panorâmica simplesmente divina. Pelo topo fica a Capela da Ascensão, construída sobre o suposto local em que Jesus subiu aos céus e que curiosamente hoje fica no complexo de uma mesquita.

Já na cidade moderna, do rico e estruturado lado ocidental, há de se passar pelas imediações da rua Jaffa, que aliás conduz à rodoviária Israelense, pela praça Safra e o governo municipal, pela Ópera, o Teatro, enquanto o Museu já fica mais longe. Em outra parte ficam o Parlamento e a Suprema Corte, assim como as residências do presidente e do primeiro-ministro. Vários são os malls, é tudo mais limpo e organizado, e por vezes você nem se lembra que está em Jerusalém. As coisas são o oposto pelo lado oriental, mas deixemos isso para os posts da Palestina.

AVISO: Jerusalém é a décima segunda cidade cujas fotos se perderam no assalto que sofri em exatamente em Jerusalém Oriental (detalhes em um post posterior); perdi um mês de fotos sem backup. Para não ficar só na descrição, seguem abaixo alguns links da net, fotos de terceiros.

http://www.israelinphotos.com/jerusalem/index.html
http://www.israelinphotos.com/gallery1.htm
http://www.jerusalemshots.com/cats-en.html



Sempre perguntam "mas e não há uma sensação diferente por se estar em Jerusalém ?". Absolutamente não. Ao menos para mim, embora saiba da enormidade de gente que realmente vai até lá para se sentir 'mais próximo' de algo; eu sinceramente não entendo essa gente. Mas era hora de conhecer o paraíso, digo, uma cidade mais adentro de Israel, para depois fazer o mesmo na Palestina ocupada. Minha próxima parada era Tel Aviv; de lá retornaria para vivenciar o lado oriental de Jerusalém e me mandar para Ramallah; porém.... oi ai, essas ironias do destino. Mas primeiro Tel Aviv.

Israel, Palestina, Jerusalém, breve intro  

Posted by carlos in ,

Bom, antes de tudo, vou me arriscar a um resumo da história, até para se entender melhor a origem dos principais locais sagrados de Jerusalém e da inimizade mútua de boa parte dos Árabes e Judeus.

Jerusalém se tornou capital do reino unificado de Israel por volta de 1000 AC graças a conquista da cidade pelo rei Davi. Seu filho, Salomão, construiu o primeiro Templo no Monte do Templo em cerca de 970 AC. Em 586 AC os Babilônios de Nabucodonosor a conquistaram e destruíram o Templo. Logo veio a conquista Persa, Ciro e depois Dario, que permitiram a construção do segundo Templo no Monte do Templo, terminado em 516 AC. Em seguida veio a conquista do Greco-Macedônio Alexandre o Grande no século IV AC, e pelo século II AC os reinos sucessores de Alexandre, o Ptolomaico e o Selêucida, disputavam a cidade e ambos foram derrotados em 168 AC pelo reino Hasmoneano, dos Israelenses Macabeus, o que veio a barrar a ascensão do Helenismo em Israel e a reforçar o Judaísmo em Jerusalém.

Veio então a era Romana ao redor do ano 6, quando o rei Judeu Herodes foi instaladao em Jerusalém; ele aumentou o segundo Templo e os muros e torres de defesa da cidade. Diversas foram as revoltas internas contra os Romanos até que eles viessem a destruir o segundo Templo no ano 70. Em 135 Hadrian passou a acelerar a Romanização da cidade e a proibir os Judeus de a adentrarem. No século IV, quando o Cristianismo já tomara conta de Roma, o imperador Constantino I contruiu a igreja do Santo Sepulcro no suposto lugar da crucificação e da tumba do suposto Jesus, além de ter lançado a semente da divisão do império Romano ao mudar sua capital para Bizâncio em 395 (tornada Constantinopla após sua morte, hoje Istambul). O domínio do império Romano, e do Bizantino após a divisão de Roma, durou até o século VII, período em que os Judeus continuaram banidos da cidade.

Em seguida veio a conquista Árabe em 638 pelo primeiro Califado Árabe, os Rashidun, que permitiram que os Judeus retornassem à cidade e que os Cristãos mantivessem seus locais sagrados. Mas foi só em 692, já no segundo Califado, o dos Umayyad, que o Domo da Rocha e a mesquita de Al-Aqsa (essa terminada em 705) foram ambos construídos no monte do Templo, sobre as ruínas do segundo Templo Judeu destruído pelos Romanos e do qual restou apenas o Muro das Lamentações. Em 1099 os Cruzados tomaram a cidade com a Primeira Cruzada, aniquilaram Judeus e Muçulmanos, e estabeleceram o Reino Latino de Jerusalém que se estendeu por parte do Oriente Médio. Foi só em 1187 que Saladin, da curta dinastia Sunita de origem Curda dos Ayyubid, reconquistou a cidade para os Árabes permitindo assim o retorno de Judeus e Muçulmanos. Em 1250 os Mamelucos conquistaram a cidade e a dominaram até 1517, quando o império Otomano enfim a anexou em meio à sua gigantesca expansão, após terem conquistado Constantinopla em 1453 pondo fim ao império Bizantino.

Os quatro séculos Otomanos terminaram em 1917 quando eles saíram derrotados da primeira guerra mundial. Nesse período os Turcos modernizaram a cidade antiga e reconstruíram sua imponente muralha (principalmente Suleiman o Magnífico), e Jerusalém começou a crescer em bairros para além da cidade murada. Com a partilha pós-guerra do Oriente Médio entre França e Inglaterra, o sul (Palestina, Transjordânia) entrou no mandato Inglês que se estenderia até 1947; durante esse mandato a população de Jerusalém triplicou de cerca de 50 para 150 mil moradores, novos bairros Judeus surgiram e a Universidade Hebraica foi fundada no Monte Scopus.

O plano inicial de partilha da ONU que alocara uma área para cada futuro estado, de Israel e da Palestina, era manter um regime internacional na cidade por uma década, depois do qual um plebiscito decidiria o futuro da Palestina Inglesa e de Jerusalém. Porém, em 1948 explodiu a guerra que teria como resultado o nascimento do estado de Israel proclamado por Ben Gurion com a capital em Jerusalém Ocidental, selando o sucesso do movimento Sionista mundial que se organizara 50 anos antes. Israel tomou sua parte do tratado da ONU; por outro lado a também recém-independente Jordânia do rei Abdullah I anexou o restante da Palestina, West Bank e Jerusalém Oriental, incluindo a antiga cidade murada que voltou a ser proibida para os Judeus.

Para os Palestinos a catástrofe foi total; além de não conseguirem seu Estado, começava o êxodo Palestino em que cerca de 700 mil pessoas se tornaram refugiadas, número que só veio a aumentar depois da guerra de 1967 quando Israel conquistou o que a Jordânia tinha anexado em 1948, cerca de 300 mil novos refugiados. Ao mesmo tempo Israel implementou e mantém massiva imigração para trazer novos moradores à Jerusalém e à outras regiões em West Bank, às custas de terras Palestinas e de Árabes expulsos, para assim aumentar a densidade demográfica Judia e assegurar mais território, enquanto os Palestinos refugiados são proibidos de retornar às suas terras.

Acho melhor parar por aqui. Em algum post eu havia escrito que viria a Israel sem pré-concepções. Mas é impossível ver os dois lados da moeda in-loco sem sair com tais pré-concepções redobradas; talvez se fosse cego, quem sabe. Deixarei a parte mais ácida para os posts da Palestina; no próximo, um pouco de turismo enfim.

Amã, capital Árabe um pouco mais 'moderna'  

Posted by carlos in

De volta ao turismo depois do post anterior. Amã é a capital e maior cidade Jordaniana com cerca de 2 milhões de habitantes. Também uma das cidades mais velhas do mundo continuamente habitadas, fez parte do reino dos Nabateus, o mesmo que construiu Petra, até o ano 106 quando Roma a conquistou; em 326 foi cristianizada e no século seguinte entrou no mundo Bizantino. É capital desde 1921, então da Transjordânia Britânica, e recebeu após a guerra com Israel em 1967 enorme parte dos refugiados Palestinos da Cisjordânia, que era território Jordaniano até então. Foi palco dos maiores confrontos entre o exército nacional e a Organização para a Libertação da Palestina, que terminaram com a expulsão do país de Yasser Arafat em 1970 depois do chamado Setembro Negro. Vale lembrar que essa organização surgiu exatamente após a guerra de 1967 e a clamorosa derrota dos países Árabes, os quais assim perderam qualquer credibilidade dentre seus grupos mais radicais.

O centro antigo se localiza ao redor da colina que hospeda a citadela Jabal al Qal'a. Embora ruínas milenares nela existam, a citadela é predominantemente um sítio Romano (chamava-se Philadelphia quando Roma a dominava) posteriormente modificado por Bizantinos e Otomanos, onde destacam-se o Templo de Hércules e o Palácio Ummayad. Ela também hospeda o Museu Arqueológico Nacional, cuja pérola são os pergaminhos do Mar Morto. A citadela é extensa e permite uma visão muito decente da cidade antiga e também do centro moderno um pouco mais ao longe. Na parte baixa, obviamente há os souqs (bazares), um enorme teatro Romano (ano 168), um menor teatro odeon, e pequenos museus nas cercanias. Já na parte mais moderna da cidade, a oeste, fica a linda mesquita do Rei Abdullah I com seu enorme domo azul, além de prédios do governo. Um pouco mais longe vale conhecer a mesquita Abu Darweesh, erigida pela minoria Cáucasa Circassiana.

AVISO: Amã é a décima primeira cidade cujas fotos se perderam no assalto que sofri em Jerusalém (detalhes no post daquela cidade, posterior); perdi um mês de fotos sem backup. Para não ficar só na descrição, seguem abaixo alguns links da net, fotos de terceiros.

http://www.trekearth.com/gallery/Middle_East/Jordan/North/Amman/amman/
http://www.pbase.com/mansour_mouasher/amman&page=1
http://www.tripadvisor.co.uk/LocationPhotos-g293986-Amman.html



Esse convívio entre religiões distintas é curioso. Estava eu caminhando pelo comércio do centro antigo. Numa parte mais central, lojas e bares onde apenas homens trabalhavam, mesmo que fosse uma loja de roupas femininas. Continuei perambulando e, conforme o comércio minguou apontando a periferia dessa área, vi uma menina de uns 10 anos num cubículo trabalhando vendendo salgados, com café no bule. Parei por lá, ela até falava pouco de inglês, e pedi um rango; a primeira coisa que ela me perguntou foi "você é cristão?". Só então percebi que ela não podia mesmo ser islâmica, se não provavelmente nem estaria trabalhando. Fiquei ali tomando café no bule e batendo papo com ela, super tímida e curiosa, enquanto seus priminhos chegavam. Pode parecer besteira, mas essas coisas valem tanto quanto uma catedral. E acho que ela não entendeu minha resposta à sua pergunta.

Mas é bom confessar a ignorância para entender que há diversos tipos de Islamismo (assim como os há de Cristianismo), o que eu ainda não compreendo direito, mas ao menos saber que nem toda mulher Islâmica necessariamente usa véu ou não pode trabalhar. É MUITO mais diverso e complexo. Mas estou aprendendo.

De Amã eu ia cruzar a fronteira, passando pelo mar Morto a 400 metros abaixo do nível do mar e pelo pitoresco deserto ao redor, até chegar em Jerusalém. São uns 75 km, e muitas horas de viagem por todo o procedimento para se entrar em Israel; depois de Israel eu ainda voltaria a Amã, de onde então desceria até Petra. Infelizmente acabei não indo flutuar em nenhuma das praias do mar Morto, nem pelo lado Jordaniano nem pelo Israelense. Mas comecemos então essa complicada etapa da viagem.

Jordânia, sua monarquia entre Árabes e Israelenses  

Posted by carlos in

Com a van-lotação de Beirute, após passar pela Síria, cheguei na Jordânia. Logo à entrada o verniz do posto de imigração é bem diferente, como se querendo passar um aspecto mais moderno do país; também não houve problemas para conseguir o visto, foi pagar e pegar. O melhor é que você pode ir de Amã a Jerusalém (cerca de 75 km a oeste) e no retorno não precisa pagar outro visto; e também não se paga para sair da Jordânia. Na mesma van havia um Belga que morava em Amã, e aí ficou fácil rachar um táxi da rodoviária ao centro onde o cara me guiou ao hotel que procurava, este aqui, barato e muito amigável.

Os cerca de 6.4 milhões de Jordanianos, 92% Sunitas, vivem em um país que tem a oeste o Mar Morto cobrindo parte de sua fronteira com Israel, enquanto o deserto Árabe cobre boa parte do resto do país; terra da lendária Petra e do quase lunar vale de Wadi Rum, ambos no sul. As primeiras civilizações em seu território foram os Cananeus; depois, Acádios, Assírios, Babilônios, Persas, Egípcios, Macedônios, Gregos, Romanos, Bizantinos e Turcos. Mas certamente a mais famosa delas foram os Nabateus, que construíram Petra. Já a capital Amã floresceu no período Greco-Romano.

Assim como em seus vizinhos, o domínio Árabe-Islâmico se instalou no país desde o século VII e os Otomanos o conquistaram em 1516. Com o fim do império Otomano na primeira guerra mundial, o país entrou junto com a Palestina no mandato Britânico depois da partilha do Oriente Médio entre Inglaterra e França (tratado Sykes-Picot). A independência veio em 1946 quando Abdullah I, que governava durante o mandato Inglês desde 1921 a então Transjordânia, foi proclamado o primeiro dos reis Hashemitas; em 1950 ele veio a anexar a Cisjordânia (o lado oeste do Mar Morto, habitado pelos Palestinos) pouco após a criação do estado de Israel. Seu neto Hussein I reinou de 1953 até a morte em 1999, quando o filho de Hussein I se tornou o atual rei Abdullah II.

São essas coisas curiosas da vida. A Síria tem sido governada por presidentes de um partido único desde 1970, da mesma família; a Jordânia e sua monarquia por reis da mesma família, desde 1946. Ambos são majoritariamente Sunitas. O primeiro é mais fechado e menos simpático ao ocidente, onde traços ocidentais sao raríssimos. O segundo é o país do Oriente Médio com maiores laços com EUA, Europa e Israel, e procura disseminar uma aparência mais moderna.

A Jordânia perdeu a Cisjordânia (West Bank e Jerusalém Oriental) para Israel na guerra de 1967; desde então Israel ocupa essa área ilegalmente, pouco se importando com resoluções da ONU por ter sempre o apoio irrestrito dos EUA. Israel continua a ferro e fogo sua política de colônias e de aumento demográfico Judeu no seio Palestino, cujos moradores continuam sendo realocados e impedidos de construir casas novas em sua própria terra; por outro lado, o estado Judeu incentiva a massiva emigração de Israelenses, fornecendo terras 'disponíveis' a quem se interessar. Há cerca de 2 milhões de refugiados Palestinos na Jordânia, grande parte em campos de refugiados. Embora a maioria tenha cidadania Jordaniana, recentemente o país deixou de conceder cidadania automática a esses refugiados, o que complicou ainda mais a situação deles; vale lembrar que, sob a ocupação, os Palestinos também não têm direito automático à cidadania Israelense (a não ser que sirvam no exército...). Ou seja, hoje há Palestinos simplesmente apátridas, que não são cidadãos de lugar algum.

Mas passemos a Amã no próximo post.

Baalbek, ruínas da Roma pagã em antiga cidade Fenícia e atual reduto Hezbollah  

Posted by carlos in

De todos os destinos possíveis para além de Beirute acabei escolhendo um mais no interior do país, a pequena Baalbek no Vale Békaa, antigo povoado Fenício e local de adoração de Baal, o Deus Sol Fenício. Depois da conquista de Alexandre O Grande os Gregos não em vão chamavam a cidade de Heliópolis, mas seu apogeu veio quando Julio Cesar, no ano 47 AC, tornou-a uma colônia Romana. Por sua localização estratégica nas rotas de comércio do império Romano, sucessivos imperadores erigiram os maiores templos desse império em Baalbek, em honra a trindade Júpiter, Vênus e Mercúrio.

O sítio histórico começa pelas Propylaea, as enormes colunas que dão passagem aos jardins internos e ao complexo de templos: o de Júpiter, maior templo Romano já construído, do qual apenas 6 das 54 colunas Coríntias de 22 metros ainda permanecem eretas; o de Baco, o melhor preservado, é também maior que o Parthenon em Atenas; o de Vênus, o menor, chegou a ser convertido em igreja Bizantina quando os mesmos dominavam a área; e fora do sítio principal ficam as ruínas do templo de Mercúrio.

Os templos foram parcialmente destruídos após o cristianismo tomar conta de Roma e sucessivos impérios deixarem sua marca na área o que, em contrapartida, fez a cidade ao redor prosperar. Recentes escavações e reconstruções tentam preservar essa que é uma das maravilhas do mundo antigo. E até mesmo aqui, nos arredores dos templos, quando procurei um ambulante para comprar uma dessas máquinas fotográficas descartáveis pois a minha estava sem bateria, o cara também tinha parentes no Brasil, em Curitiba, já tinha ido visitá-los e arriscava umas frases em português. Sem comentários!

A cidade em si, que emergiu ao redor dos templos, parece um outro mundo se comparada a Beirute ou a outras cidades da costa. Sua atmosfera é bem mais tradicional, raros são os traços ocidentais. Vale ressaltar que Baalbek fica numa área que é reduto do Hezbollah; você anda pelas ruas e elas são cheias das bandeiras do grupo e de posters de seus líderes. Afinal, para boa parte da população Libanesa, foi o Hezbollah que os defendeu quando eles foram largados à própria sorte após a invasão de Israel em 2006 já que todo o ocidente, como de costume, nada fez contra o eterno aliado.

As fotos de Baalbek foram as únicas que não se perderam quando fui assaltado em Jerusalém (veja post posterior, daquela cidade) justamente por eu ter usado uma máquina descartável. As fotos estão abaixo, embora sejam poucas devido ao limite do rolo.



De Baalbek retornei a Beirute. Como a fronteira sul com Israel está fechada, não há como fazer o percurso mais fácil que seria ir do Líbano a Israel, de Israel a Jordânia, e por fim da Jordânia ao Egito pelo Mar Vermelho. O jeito foi ter que pagar de novo aos homens de bigode em verde-oliva Sírios, na entrada e na saída, apenas por cruzar alguns quilômetros de suas terras antes de entrar na Jordânia, rumo a Amã. Inclusive na saída Síria lembro-me do rapaz verdejante, na maior cara-de-pau, me cobrando um valor acima do próprio recibo que ele me forneceu; o motorista da lotação que peguei em Beirute veio sorrindo até mim como quem dissesse "vamos embora meu chapa, é assim que funciona por aqui". A seqüência do percurso não seria menos complicada, em tão pequena distância! Mas vamos por partes; inicialmente, minha próxima parada seria Amã, capital Jordaniana.

Beirute, cidade que teima em reviver das cinzas, parte II  

Posted by carlos in

(...continuação)

A diáspora fez haver mais Libaneses no exterior do que no próprio país. São atuais 4 milhões de habitantes no país, enquanto cerca de 11 milhões vivem no exterior, a maioria disparada no Brasil, 6 milhões, principalmente Sul e São Paulo. Sua história recente é tão marcada por essas guerras internas e invasões que nenhuma geração Libanesa sabe o que é viver em paz. Boa parte do centro de Beirute estava reconstruída quando eu estive por lá, menos de 4 anos após a selvageria covarde Israelense, mas isso se restringindo mais ao centro moderno, às margens do Mediterrâneo, morada de uma classe mais alta, de prédios do governo, e hoje abarrotado de estabelecimentos comerciais americanos e europeus. Em certas ruas mal se lembra que estamos no Oriente Médio, diversos prédios novinhos em folha com uma arquitetura fria e descaracterizada, ao menos para mim; mas como dizem, bem melhor assim do que com bombas caindo do céu. Afastando-se do litoral mergulhamos em uma Beirute mais real, que tem também muitos traços modernos ao lado dos tradicionais, e onde se vê ainda marcas de suas recentes guerras em prédios levemente esburacados ou completamente destruídos.

Sua cultura, arte, música, comida não me eram assim tão estranhos dada a enorme imersão Libanesa que há no Brasil e no Canadá, onde vivi e mantive boas amizades com alguns de seus descendentes. Há muito que nutro enorme admiração por esse povo e sua alma, sofrido e rica como poucos, e estava muito contente por ter me dado a oportunidade de conhecer um pouco do país. E realmente eu não me surpreendia com a enorme quantidade de pessoas que ficavam contentes quando eu falava que era Brasileiro, e que inevitavelmente falavam de algum parente que morava no Brasil, por vezes arriscando algumas palavras em Português; inclusive os donos do hotel disseram que em copa do mundo se reunem com os amigos para assistir e torcer pela seleção. Sinceramente acho que não damos o devido valor a essa gente calorosa em nosso próprio país. É difícil um forasteiro entender como essas gerações conseguem viver, conviver e superar seus traumas, sejam cristãos ou islâmicos, de costumes mais ocidentalizados ou mais tradicionais.

Beirute é naturalmente belíssima. Quase metade dos Libaneses vivem na capital, coração cultural e econômico do país, e a cidade religiosamente mais diversa de todo Oriente Médio. Seus pontos altos são o passeio pelo litoral, incluindo o Corniche, a Raouché e o bairro Hamra, a zona mais boêmia da cidade; estava louco para entrar no Mediterrâneo mas a chuva trouxe um frio infeliz por aqueles dias. Depois, ir conhecer a parte mais distante da costa e ter contato com o dia a dia mais real. Pela área mais reconstruída, no centro novo e nas proximidades das sedes governamentais, destacam-se a Torre do Relógio, a sede da ONU, o Parlamento Libanês, as ruínas do Forum Romano, e a suntuosa mesquita Al-Omari com seu domo azul, inicialmente do século XII. Pouco além fica o Grand Serail, um complexo que inclui palácio do presidente e sede do primeiro ministro, no topo de uma pequena colina, construído inicialmente como sede do poder Otomano; também valem uma visita a catedral Maronita de São Jorge e o Museu Nacional, localizado ao redor da antiga Linha Verde.

AVISO: Beirute é a décima cidade cujas fotos se perderam no assalto que sofri em Jerusalém
(detalhes no post daquela cidade, posterior); perdi um mês de fotos sem backup. Para não
ficar só na descrição, seguem abaixo alguns links da net, fotos de terceiros.

http://www.trekearth.com/search.php?phrase=beirut&type=&x=22&y=16
http://www.galenfrysinger.com/beirut.htm
http://www.tripadvisor.co.uk/LocationPhotos-g294005-Beirut.html



Ainda em Beirute queria conhecer outro destino próximo no pequeno país, para ir e voltar no mesmo dia. Acabei optando em sair do litoral e ir ao interior, em Baalbek, no próximo post.

Beirute, cidade que teima em reviver das cinzas, parte I  

Posted by carlos in

Quando o ônibus chegou na fronteira, após pagar a taxa de saída da Síria a primeira coisa seria conseguir o visto Libanês, mas esse deveria ser e foi menos complicado que o Sírio (dessa vez segui viagem no mesmo ônibus, e não se paga para sair do Líbano). Porém, meu dinheiro era insuficiente, não tinha como sacar, e acabei dando sorte pois havia outro forasteiro no ônibus que me emprestou grana na boa. Chegando em Beirute, fomos procurar um teto barato e rachamos um quarto nesse hotel; o forasteiro era americano (havia fugido da China por ter veiculado uma matéria anti-governo), e os caras do hotel não poupavam 'elogios' ao coitado por todo suporte que os EUA fornecem a Israel e pelo bombardeio Israelense que arrasou Beirute em 2006. No mesmo hotel, cujo dono ia em breve visitar um primo que morava no Brasil, residia um australiano fazendo parte de seu doutorado em Conflitos do Oriente Médio, e que conseguia ser mais anti-Israel do que eu. Obviamente nós três saíamos para nossas cervejas e narguiles, e o papo era bem interessante!

Beirute é mesmo uma cidade singular, passou e passa por tanta destruição e reconstrução, e ao mesmo tempo carrega (e talvez por isso) uma das juventudes mais vívidas do Velho Mundo. E o Líbano tem tanta proximidade conosco pelo enorme número de imigrantes forçados que aportaram no Brasil. A chegada em Beirute já valeria a visita. Passada a fronteira, a pista primeiro sobe uma serra enorme; do topo, já se avista o Mediterrâneo azul lá embaixo, as demais montanhas ao redor da cidade, algumas cobertas de neve, enquanto a capital Libanesa vai se abrindo aos poucos conforme descemos a serra.

O pequeno país possui inúmeros sítios históricos, como as cidades Fenícias de Biblos e Tyrus no litoral, e Baalbek no interior. O atual Líbano foi morada dos antigos Fenícios (1200-539 AC) que se espalharam pelo Mediterrâneo, fundando povoados por toda a costa, principalmente Cartago; criaram o alfabeto tido como o precursor dos alfabetos modernos, como o Grego e o Romano. Em 539 AC o império Persa sob Ciro conquistou os Fenícios, e dois séculos depois foi a vez do Macedônio Alexandre O Grande. O atual Líbano passou depois por mãos Assírias, Gregas, Romanas, Árabes, Turcas Seljuk e finalmente Otomanas em 1516. Com a derrota dos Otomanos na primeira guerra mundial e a posterior divisão do Oriente Médio entre França e Inglaterra o Líbano, assim como a Síria, entrou no mandato Francês. A influência Francesa é visível em Beirute onde parte da população, principalmente as classes mais altas, fala Francês. A independência Libanesa veio em 1941, embora as tropas Francesas só se retiraram após o fim da segunda guerra mundial em 1946.

O pacto nacional nesse pequeno e tão diverso país estabelece que o presidente seja um cristão maronita, o primeiro ministro um muçulmano sunita, e o parlamento tenha dois líderes, um muçulmano shiita e um grego ortodoxo. Quase inevitável, a guerra civil estourou em Beirute em 1975 e durou quinze anos; ela ainda foi agravada pela invasão Israelense no lado Muçulmano (oeste) da cidade, enquanto os Cristãos se concentravam no lado leste da chamada Linha Verde. Foram cerca de 200 mil mortos, 900 mil deslocados (20% da população), e uma enorme diáspora Libanesa se seguiu. Após longo período de reconstrução, um ano após a saída das tropas Sírias que ocuparam o país até 2005, os Libaneses celebravam seus melhores momentos; foi quando o Estado Terrorista Israelense invadiu o país por causa das atividades terroristas do grupo Hezbollah, destruindo novamente Beirute e ceifando a vida de milhares de civis inocentes.

(continua...)

Damasco, antiga capital do mundo Árabe  

Posted by carlos in

Descendo de Aleppo a Damasco, capital e maior cidade do país e tida como a cidade mais antiga do mundo continuamente habitada, perdi a chance de conhecer Palmyra mais ao leste do país; suas ruínas devem ser mesmo de tirar o fôlego de qualquer um, mas agora eu tinha uma data certa para pegar o vôo de retorno em Cairo e preferi não arriscar. Em Damasco eu sabia deste ultra-luxuoso hotel, no centro da cidade, que possuía um ou dois quartos no subsolo para os mais pobretões (creio que era para os empregados); foi mesmo jóia, paguei preço de albergue e curti as dependências do nobre aglomerado de cimento.

Habitada desde séculos antes da era Cristã por diversas culturas como Hititas, Persas, Assírios, Egípicios, e Babilônios, depois tomada por Alexandre O Grande em 323 AC e conquistada por Roma (mais tarde Bizâncio) no ano 64, o apogeu de Damasco se deu após a derrota dos Bizantinos e a conquista Árabe no século VII. Isso porque o Califado Umayyad (661-750) escolheu Damasco como sua capital; esse foi o mesmo Califado que construiu o Domo da Rocha em Jerusalém e a Mesquita de Córdoba na Espanha, época em que o mundo Árabe chegou a constituir o maior império do planeta. Os Umayyad foram o segundo Califado Árabe, sucedendo os Rashidun (632-661) que tinham sua capital em Medina, e que por sua vez surgiram após a conquista de Meca e a morte de Maomé no ano 632.

Os Umayyad foram suplantados pelo Califado Abbasid (750-1258), outro clã que se considerava o verdadeiro herdeiro do profeta Maomé e que se tornou o mais longo dos Califados deslocando a capital para Bagdá, iniciando assim o gradual declínio de Damasco. A importância da cidade continuou diminuindo com as dinastias seguintes e ainda mais após a conquista dos Otomanos, que vieram a se impor por todo o mundo Árabe, centralizados em Constantinopla. Com o fim do império Otomano na primeira guerra mundial e o nascimento da secular Turquia, França e Inglaterra costuraram o acordo Sykes-Picot que recortou as antigas posses Otomanas no Oriente Médio; o norte (atuais Síria, Líbano) para a França, o sul (atuais Jordânia, Palestina-Israel) para a Inglaterra. Apenas no fim da segunda guerra mundial a Síria (assim como as outras demais colônias) conquistou sua independência, com Damasco permanecendo sua capital. Desde então a cidade tenta reconquistar seu destaque, embora o governo Sírio mantenha o país como um dos mais fechados da região.

O centro antigo de Damasco no passado era todo murado, com sete Portões dando acesso à cidade. Em seu interior destacam-se: as ruínas da citadela-castelo, terminada em 1078 pelos Turcos Seljuk e retocada várias vezes pelas dinastias seguintes que tomaram posse da cidade; o khan As'ad Pasha (1752) e outros caravanserias, e os típicos e diversos bazares como o Al-Buzuriyah; a mesquita Umayyad, do ano 715, uma das mais velhas e maiores mesquitas do mundo, super sagrada para os Muçulmanos, erigida sobre o sítio de uma basílica Cristã dedicada a João Batista logo após a conquista Árabe, e onde a cabeça daquele profeta supostamente se encontra num relicário que recebeu a primeira visita de um papa em 2001, João Paulo II; próximo à essa mesquita fica o mausoléu de Saladin (1196), que junto à sua estátua na entrada da citadela formam a homenagem a esse herói do mundo Islâmico que derrotou os Cruzados e reconquistou Jerusalém em fins do século XII, resistindo ainda às seguintes investidas da Terceira Cruzada de Ricardo Coração de Leão patrocinada pelos Ingleses.

Nos arredores do centro antigo ficam o bairro Cristão Bab Tuma, a capela de São Paulo, e a casa de Ananias, local onde o mesmo supostamente converteu Saul no apóstolo Paulo. Já no setor mais moderno na cidade, em parte recortado pelo rio Barada, obrigatórios são a praça Umayyad, o enorme e rico Museu Nacional, a mesquita Tekkiye, a Universidade de Damasco, a Biblioteca Nacional e a Ópera Nacional. Próximo ao hotel, além de uma zona de vários bares e comércio, fica a sede do governo. O partido Baath controla o país desde a derrota na Guerra dos Seis Dias contra Israel, que teve como presidente Hafez al-Assad de 1970 até sua morte em 2000 quando seu filho Bashar al-Assad assumiu a cadeira.

Causou-me espanto aliás perceber o quanto as figuras dos al-Assad são cultuadas e copiadas. Posters e outdoors, chaveiros e vidros dos carros carregam suas fotos em poses, me desculpem, por vezes ridículas (algumas com cara de galã, óculos escuros e tal); mais de uma vez me pediram para tirar foto onde a dada pessoa posava orgulhosa ao lado de um poster dos digníssimos. Sem contar que 9 em cada 10 jovens conservam aquele mesmo bigode de seus líderes, mas talvez seja apenas uma tradição masculina. Um forasteiro não tem a menor condição de julgar nada, eu apenas não acho um bom sinal todo esse culto, espontâneo ou forçado. Tomara que seja apenas a admiração de uma população que sinta os motivos para venerá-los assim.

AVISO: Damasco é a nona cidade cujas fotos se perderam no assalto que sofri em Jerusalém (detalhes no post daquela cidade, posterior); perdi um mês de fotos sem backup. Para não ficar só na descrição, seguem abaixo alguns links da net, fotos de terceiros.

http://www.trekearth.com/search.php?phrase=damascus&type=&x=0&y=0
http://www.galenfrysinger.com/damascus_syria.htm
http://www.tripadvisor.co.uk/LocationPhotos-g294011-Damascus.html



Já com a companhia de muita chuva que me seguiria por algum tempo, estava na hora de ir embora de Damasco e da ainda fechada Síria, cuja população é cerca de 80% Sunita. A próxima e esperada parada seria Beirute, Líbano!